Eu não falo mais sobre isto, aqui no blog e fora dele, porque não me parece um tema interessante para a maioria das pessoas (dentro e fora de blogs). Quem quer saber se tenho ou não tempo para o meu trabalho? ( "Qual trabalho? Fazer bonecos?" )
A minha avó dizia que certas mulheres não deviam constituir família. E ela, que adorava a família que constituiu, sabia muito bem o que dizia. Ela sabia que tinha ficado para trás, que não chegava nem a metade daquilo que era suposto ser e que, no fundo, ninguém a conhecia. Ela era grande, enorme, não cabia dentro de si. Mas teve filhos, teve marido, teve noites em que costurava e embalava choros de criança, teve que dizer não a muita coisa que só queria dizer sim. Viveu a vida dentro do mundo que construiu, um mundo à sua imagem, amplo o suficiente para que não asfixiasse. Aquilo que conseguiu fazer foi muito, mas muito pouco para o tamanho da sua alma.
Há dias em que me sinto tão grande dentro de mim que quero sair, preciso sair, tenho de sair. Que se tivesse que assinar o meu nome ele teria metros de altura. E é dessa necessidade (de criar) que falo quando me queixo da falta de tempo. É uma questão de vida ou morte - a da alma! Não é uma vontade de fazer umas costurazinhas; é uma necessidade de ultrapassar, de aprender, de pôr em prática, de conquistar, de construir! A máquina de costura é apenas uma ferramenta, ela não é importante. É o trabalhar as ideias e transformá-las, ver uma ideia ganhar corpo, sentir-me pequena perante uma criação da qual fui meramente participante, esvaziar esta bolha gigante que vai sufocando por dentro até rebentar. Não sei bem como me fazer entender mas tenho a certeza que há muitas mulheres que sentem o mesmo por aí.
Se o meu trabalho reflecte isto? Não. Os bonecos que tenho em mente ainda não foram feitos e não sei quando terei tempo para os fazer. Mas os que faço vão-me ensinando a chegar lá um dia. Pelo menos assim o espero. Mesmo que mais ninguém se interesse. E fazer estes bonecos faz-me bem - não sei se à cabeça, ao coração, à alma ou a tudo que sou -, faz-me verdadeiramente feliz e satisfeita. A bolha gigantesca acalma-se e dá-me uma palmadinha nas costas. Sorrimos as duas.
Mas se tenho dois filhos é porque decidi ter dois filhos e mesmo que me roubem todo o tempo que de outra forma teria para trabalhar, estes dois filhos não podem ser responsáveis pela minha frustação. Mesmo que me sinta a rebentar eu tenho que respirar fundo e sentir-me grata pela sorte que é ter dois filhos como os meus. Basta olhar para as suas caras, os seus sorrisos tão puros e pensar que a vida é um mistério, que não sei quanto tempo por cá andarei, pior ainda - pesadelo dos pesadelos - quanto tempo eles por cá andarão, que essa ansiedade se vai acalmando, pelo menos por mais um dia, porque a minha vida já não é só minha.
Os dias são inglórios? Sim. São passados em pijama? Sim. Estou de bolsos vazios? Sim. Mas por agora, pelo que sei e pelo que já vivi, não troco esta forma de vida por nenhuma outra.
Estou a crescer.